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Aqui expresso com liberdade meu pensamento crítico, opiniões e reflexões diante de coisas que para mim são importantes, como pessoa e como cidadão. Espero ter sempre algo a publicar aqui, além do que tenho para cantar nos CD´s, e que esse algo seja interessante para você também.
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Sérgio Lopes
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segunda-feira, 12 de janeiro de 2009


O REPENTISTA NORDESTINO

Existem artes que podem ser apreciadas por toda a humanidade, como por exemplo a pintura, a escultura, a sinfonia. Outras artes são exclusivamente inerentes à própria cultura nacional de um país, e somente pela linguagem nativa dessas culturas são compreendidas. A rainha dessas artes, que utiliza a linguagem como suporte necessário e obrigatório, é a poesia.
Quem é brasileiro e já leu alguma poesia de Gonçalves Dias, Vicente de Carvalho, Casimiro de Abreu, Humberto de Campos, Castro Alves, Augusto dos Anjos, Patativa do Assaré, ou até mesmo Fernando Pessoa (que, mesmo sendo europeu, nos brindou com a graça de ter nascido português, e nesse idioma ter escrito seus textos), desconfia das poesias sem ritmo e sem rimas, que não apresentam uma forma definitiva de construção artística, senão meramente semântica, mesmo que exprima uma idéia inspirada. Não diria que a inspiração seja cliente preferencial das construções rimadas, mas a poesia sem rima e sem métrica às vezes me parece, nesse mundo capitalista e cheio de ardis mercadológicos, uma tentativa de se vender a tradução de poemas que, no idioma do poeta que o escreveu, possui rimas e ritmos coordenados, produzindo, seja esse idioma qual for, uma beleza digna de encantar os nativos. Porém, traduzidas, a rima e a beleza métrica das frases se desfazem, mantendo-se apenas a idéia do texto, disforme, sem charme, sem a beleza artística como o poeta a concebeu, ao que se dá o nome de prosa. Então nascem os incontáveis livros de prosas, fruto de tentativas ávidas de tradutores em vender um texto cuja beleza plena jaz apenas no texto nativo. O incrível é que existem pessoas que, atraídas pela magia de algumas frases que acabam sobressaindo-se na vastidão da prosa, compram e recompram essas obras de teor desfigurado pela tradução impiedosa, sem se aperceberem do ardil da substituição de um belo texto nativo pleno que agora é adulterado pela tradução de um despoeta, que chega ao mercado de consumo travestido de “poema em prosa”.
Pois é! Isso começou com a Inglaterra! Desde 1808 nós somos o único país onde as culturas do resto do mundo conseguem vender o que para eles é sobejo. Até poesia desfigurada se vende aqui. O mercado nos apresenta essas baboseiras e nós, escravos da propaganda bem feita, as compramos, sem nos apercebermos que enriquecemos o estrangeiro com nossa moeda, e ficamos mais pobres de cultura com o que eles nos dão em troca. Alguns brasileiros que ainda não descobriram a força de se ter uma identidade nacional se encantam por qualquer porcaria que é “made in lá fora”. (Não é à toa que sou fã de Ariano).
Sabe o que deveria ter propaganda bem feita? Aquilo que é nosso! Construído aqui. Inventado aqui. Descoberto aqui! Original daqui. Quem merece ter propaganda bem feita é o nosso café, nosso petróleo, nossa laranja, nossos sapatos, nossos próprios vinhos, nossa carne de cabra, nosso repente! Hein?! Não sabe o que é “repente”? Pois é! Eu vim aqui falar mesmo é sobre o “repente” nordestino, uma arte nativa do Brasil, que em nenhuma outra cultura é sequer ensaiada, e originária do nordeste do Brasil. Uma poesia cantada de composição imediata, instantânea, desafiadora, incomum e exige, além da perfeição métrica e da rima absoluta, vocação, preparo cultural e enorme concentração mental. Os cientistas da mente e psicólogos mais eruditos não compreenderiam se ouvissem um desafio de violeiros repentistas, dada à velocidade de raciocínio e precisão matemática e gramatical de cada frase que os repentistas se obrigam a construir em seus desafios cantados. Eu vi! Muitas vezes eu vi e ouvi lá em Campina Grande! Mas os repentistas também existem em Pernambuco, pelo Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte, Alagoas e Sergipe, Bahia e Maranhão! Uma frase pode ser dita por qualquer um presente numa platéia, na praça ou num teatro, uma frase medida em sílabas (chamada de “mote”), e sobre qualquer assunto que se possa imaginar, e o repentista imediatamente, sem tempo para pensar nem escrever, cantará uma música improvisada em quantas estrofes queira, porém, perfeita e sincrônica, utilizando a frase dada (mote) para o acabamento de sua cantoria, construindo um poema perfeito, com relevante conteúdo social, apesar do texto simples para ser compreendido pelo povo que assiste e aplaude. O Brasil praticamente desconhece a poesia de repentista! Um produto puro, nativo, que nenhuma outra cultura poderia copiar, e por isso mesmo começa a ser examinada pela inteligente cultura da região sul, onde os descendentes de imigrantes europeus (porém nascidos aqui), estão descobrindo essa fantástica arte construída com seu idioma nativo, o nosso português. Gramado já descobriu o “repente”! Isso é bom.
Essa expressão de arte, no entanto, se mantém ainda enclausurada em seu estado bruto nas cidades e capitais do nordeste, esperando o dia em que os promotores da arte nacional percebam que ela é extremamente nativa, única, cativante, bela, complexa, apresentável nas praças e nas bilheterias. Até Portugal já viu e se interessou em apresentar em terras lusitanas o nosso repente. Fingir não perceber a poesia repentista é, a meu ver, uma das maiores gafes da nossa Academia de Letras, e um descuido dos poetas que estão lá que, como eu, constroem seus poemas escritos às custas de horas de construção, rabiscos, correções e alterações. Um repentista é a própria poesia encarnada, nua e pura, sem retalhos nem maquiagens. Outro erro é as grandes casas de espetáculos não promoverem divulgação e produzirem grandes encontros de repentistas. Isto é uma castração à nossa cultura popular. Os poucos eventos que são realizados com repentistas, são produzidos por amadores, em locais pequenos, com esforços mínimos, a estrutura é pífia, a iluminação é pobre, a sonorização é deficiente, de forma que muitas frases não são entendidas pela platéia. Ou seja, a poesia repentista ainda não foi elevada ao seu merecido lugar no pódio das artes brasileiras. As Secretarias de Cultura dos Estados nordestinos não se aperceberam ainda desse gigante adormecido para a construção de um autêntico modelo de suporte cultural, que pode suprir de recursos suas contas e alegrar seu povo, trazendo uma agitação urbana pura, forte e sem riscos de crise, por que a arte do repente é uma fonte que jorra com abundância por todos os recantos do nordeste, e onde é apresentada encontra platéias e aplausos. Quando a poesia repentista encontrar seus patronos, terá seu lugar definitivo nas grandes casas de espetáculo desse país, com grande encontros de desafios de repentistas, onde o público de todas as camadas sociais verão que essa arte é muito expressiva para ficar reduzida a pequeninas platéias, e inexpressivos cachês. O repente é divertido, engraçado, rico em arte e principalmente é expressão de uma arte popular. Em frente, repentistas! Eu sou um nordestino que fez sucesso no Rio de Janeiro, por que um dia um empresário audacioso me ouviu e investiu. Resultado: ficou rico! Espero que um empresário desse nível descubra e invista nessa arte tão plena que é a poesia repentista, da qual sou absolutamente cativo. E aproveito para deixar um mote para um decassílabo:
“Pro nordeste ir ao mundo só precisa
Do repente, a viola e um cantador”

Sérgio Lopes
(Dedico este texto ao poeta Alfrânio Gomes de Brito, grande amigo e também, como eu, amante da poesia repentista.)
Quer ouvir um repente? Clique no link abaixo e ouça Raimundo Nonato e Nonato Costa improvisando sobre o mote:
"O planeta movido a internet
É escravo da tecnologia"

11 comentários:

Anônimo disse...

Eeehhh! bRAVO!!! Eu mesma nunca ouvi um repente! E olha vc q sou brasileirissima. Já vi em filmes; e todas as poucas vezes q ouvi fiquei em estado de atençao total,rs. Queria ouvir mais... como nunca fui p o Norte/Nordeste... Uma vez li uma materia sobre musica (em uma revista de domingo de um jornal,em um jornal europeu,creio q era El Pais),q falava sobre ritmos desconhecidos. Dizia q estavamos muito longe de descobrir todas as maravilhas escondidas pelo mundo a fora. Entre alguns poucos exemplos estana o repente. Esplicaram + ou- como era. E eu fiquei toda euforica... Embora eu mesma nunca tinha visto ao vivo...rs.
E sobre a poesia faz pouco tempo q caiu minha ficha sobre isso de traduzir. Realmente se perde muito da alma da poesia. Foi lendo Neruda em castellano e em portugues q me desiludi...rs.
Bjo, meu poeta.

Anônimo disse...

Bravo, meu irmão!

Somente a sensibilidade de um “nordestino de fibra” para saber encarar, com responsabilidade, o descaso das nossas autoridades para com a nossa cultura popular. Assim, galgando mundos e ambientes outros, você, na sua qualidade e grandeza de poeta conterrâneo, comparando-a com culturas diversas por onde andou, despertou (mais uma vez) para a magnitude das construções do nosso cancioneiro – diga-se de passagem, invejável!
Como havíamos comentado, lá fora (e mesmo em alguns lugares aqui dentro) esse produto não é conhecido ou consumido, por falta de uma divulgação bem estruturada, o que lhe deixa preso nos quatro cantos no nosso tão mal pago Nordeste. Entretanto, hoje, a sua voz está gritando lá dos confins do Brasil e começa chegar até nós... E nós a propagaremos.
Estamos juntos mais uma vez, meu velho poeta... E que Deus nos abençoe nesta jornada!

Muito obrigado pela dedicatória! Acho que não merecia tanto...

Meu mais caloroso abraço.
Alfrânio.

CANTOR PAULO ROBERTO disse...

Caro amigo e poeta Sergio Lopes, dou graças a Deus por voce ter escrito este texto. Pois antes pensava eu ser um ignorante cultural. Pois quando eu lia algumas poesias sem rima e complicadas, mas tão exaltadas pelos criticos de arte, eu confesso nao entendia nada e sentir menos ainda. Cheguei a conclusão que não sou tão tapado assim, após ler a sua bela crônica. Eu sou fã incondicional de repentistas e me rendo ao talento e inteligencia incomuns de poetas como Geraldo Amâncio, aqui do Ceará.(nao sei se já o ouviu, mas se nao, procure ouvi-lo)
Obrigado amigo pela coragem de falar tão abertamente a todos nos. "Viva os Repentistas".

Sérgio Lopes disse...

Cara Anonima, fico feliz que tenha entendido meu texto, e entendido a riqueza cultural da nossa própria poesia. Forte abraço.
Caro amigo compositor Paulo Roberto, voce realmente jamais seria um ignorante cultural! Conheço de perto sua poesia e seu talento, dos quais sou apreciador. E não se esqueça do que conversamos sobre sua profissão, que é uma das mais antigas e mais deslumbrantes desse mundo. Desejo que voce seja o melhor no ramo em que estiver. Forte abraço!
Caro irmão Alfrânio, segui sua sugestão e já alterei o mote. Rapaz! que saudade daquela janta maravilhosa, regada a bode guisado (vixe! que coisa boa foi aquela!) e pra arrematar aquele doce de caju feito em casa, mas onde a melhor parte foi a sua companhia e da Socorro. Já estou trabalhando na idéia do nosso projeto que já tem até um nome: "Tribuna do Repentista". Mais clássico do que isso impossível, certo? Grande abraço (pra caber vc e a Socorro!) rs!

Tirando a máscara disse...

CLAP! CLAP! CLAP! Prezado e amado Sérgio, por este seu texto, você merece o globo de ouro. Tenho certeza que até o Ariano tiraria o chapéu para você.
É triste quando saímos do nordeste e vamos para qualquer outra região do país e não se conhece o repente ou quando os raros que "tem conhecimento" dizem que manisfestação cultural mesmo é o hip hop. Aposto que, pelo menos eles pensariam um pouco sobre o nordeste e sua riqueza cultural, se ouvisse o repente Imagine o Brasil ser dividido e o Nordeste ficar independente.

Parabéns meu irmão por esta postagem.

Anônimo disse...

Sérgio Lopes tudo bem?! Bem, eu já postei aqui no seu blog mas hoje eu venho te escrever por uma causa nobre. Como eu já disse em outros comentários, eu te ouço desde muito nova (desde os 11 anos de idade aprox.) e o ainda naquela época ao ouvir o louvor "Lamento de Israel" eu senti um forte desejo de aprender a tocar violino. Não foi fácil, mas eu consegui pela graça de Deus tocar este instrumento tão delicado e maravilhoso. Só que até hoje eu não consegui a partitura do solo do louvor "Lamento de Israel" e hoje pela manhã eu me lembrei do seu blog e vi nele a oportunidade de te perguntar se você por acaso tem a partitura desde solo/hino tão lindo! Aguardo ansiosamente por uma resposta. Vou deixar o meu e-mail aqui, ok?!
huandra@hotmail.com
ou
huandra@gmail.com

Desde já, muito obrigada e A Paz do Senhor.

Anônimo disse...

Esse é o abençoado do Ir.Sérgio... Sem vergonha das suas raízes, ao contrário, tem orgulho de pertencer a essa terrinha. Né não,oxente?! Que bom vê-lo a divulgar e defender a arte puramente nordestina com tamanha paixão... Que Deus te abençoe meu irmão!!
Como nordestina que sou, vou arriscar uns versinhos de 'repente':

"Olhe aqui meu irmão,
o quero lhe falar
que é bom servir a Deus
e o seu Nome exaltar...
Se não tem inspiração,
um conselho vou lhe dar,
é só ouvir o Sérgio Loooooopes,
você aprende o que é louvaaaaaaar"

Eita povo arretado!!!!
Na Paz, na Graça e no Amor de Cristo nosso Senhor, Cileide Cabral - Natal/RN

CESAR AMORIM disse...

Poeta Sérgio, Sou nordestino da nata (como dizem por aqui),sou de Antonio Martins RN, fiquei muito feliz ao ler esse seu texto sobre os repentistas, meu Pai(já felecido) era Poeta e Político, adimirador da poesia tambem, inclusive estou escrevendo aos poucos alguma coisa sobre ele pra depois juntar com o que ele deixou excrito nas suas cavetas e lançar aos conterranes para tentar diminiur um pouco a saudade. Mais feliz ainda fiqei quando vi que la em baixo do texto vc dispinibilizou o belissimo repente dos NONATOS (seus conterraneos), esse dois cidadãos tem com muito talento alavancado e levado ao todo tipo de gente a música e a poedia de qualidade, não é atoa que estão conhecidos e reconhecidos em todos o Brasil.
JÁ ME CONGREGUEI MUITO TEMPO NA ASSEMBLÉIA DE DEUS, HOJE NÃO ME CONGREGO EM IGREGA ALGUMA, MINHA MENTE FICOU EMBRARAÇADA COM MUITOS "PORQÊS" E ACHEI POR BEM FICR NO MEU CANTO..MAS NUNCA DEIXEI DE ADIMIRAR E SEMPRE OUVIR SUAS CANÇÕES E ELAS NUNCA DEIXARAM DE ME AJUDAR E ALIMENTAR MINA VIDA ESPIRITUAL. UM FORTE ABRAÇO POETA..
cesar.c.a@hotmail.com
cesardetiticocom.blogspot.com

Anônimo disse...

parabens pelo blog...
Na musica country VIRGINIA DE MAURO a LULLY de BETO CARRERO vem fazendo o maior sucesso com seu CD MUNDO ENCANTADO em homenagem ao Parque Temático em PENHA/SC. Asssistam no YOUTUBE sessão TRAPINHASTUBE, musicas como: CAVALEIRO DA VITÓRIA, MEU PADRINHO BETO CARRERO, ENTRE OUTRAS...
é o sonho eterno de BETO CARRERO e a mão de DEUS.

Maciel, Silas disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Maciel, Silas disse...

Ah, que saudade isso me trouxe do meu Recife, e das idiossincrasias do nordeste. Dos repentistas, que por ali andam com suas violas, pelas praias de todo o litoral e ladeiras de Olinda. Homens inteligentes com uma percepção aguçada que improvisam com tamanha genialidade e simplicidade que põe em xeque os nossos conceitos eruditos de cultura. É mesmo lamentável que este tesouro seja restrito a um público tão pequeno e que a nossa cultura popular seja invadida por uma “cultura popular” cada vez menos nossa, realmente já está mais que em tempo de nós conhecermos o que temos de bom a oferecer em nosso próprio solo.
Fique na Paz do Senhor. Amém.